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sábado, 18 de julho de 2015

Novo Testamento - Veracidade e Historicidade - Parte 1

A arqueologia e a história tem nos ajudado a compreender e também a confirmar a veracidade do Novo Testamento. Mas o que é novo testamento? É a coleção de livros que compõe a segunda parte da Bíblia cristã. São ao todo vinte e sete livros, a saber: quatro evangelhos que narram a vida e ministério de Jesus, um livro dos atos dos apóstolos que contam os primórdios da igreja cristã, vinte uma cartas ou epístolas de diferentes autores e um livro de revelações chamado de apocalipse. Vamos entender um pouco mais sobre as histórias e fatos dessa tão importante obra.

A chamada cartas aos hebreus é considerada por muitos teólogos não como uma carta e sim como um tratado. Logo alguns acadêmicos entendem que deveríamos falar de vinte cartas e não vinte uma, mas esse é um detalhe teológico para outra ocasião. Pois bem, o teólogo Josh Mcdowell, escreveu certa vez, com muita propriedade, que o antigo testamento era a preparação para vinda do messias. Neste caso, os evangelhos seriam a sua manifestação, o livro de atos a proclamação de sua mensagem e as epístolas e explicação dela. E o livro de apocalipse seria a consumação da obra messiânica. Realmente, tudo na bíblia, parece gravitar em torno do messias, em torno de Jesus de Nazaré.

É importante saber que o novo testamento não foi escrito em hebraico como as escrituras judaicas, mas foi escrito antes em grego koinê. O motivo era que o grego se tornou a língua franca nos dias em que o novo testamento nasceu e o cristianismo progrediu. O próprio Império Romano adotou o grego como língua internacional a ser usada especialmente na parte oriental do seu território. Isso facilitaria o comércio, as exportações e controle administrativo das regiões conquistadas. Um fato interessante é que os romanos embora tivessem o latim como sua primeira língua não tinham o interesse em torná-lo uma língua universal. A razão disso é que se precisassem conversar algo mais particular, perto de colonos ou cidadãos sub-julgados, poderiam fazê-lo em latim, mantendo deste modo certo sigilo no diálogo.

A chance de um estrangeiro saber latim era tão pequena que assim eles poderiam se comunicar de maneira secreta, pois eles não estudavam o latim como estudavam o grego. Deste modo, autores do novo testamento se valeram do grego para escrever os seus documentos mesmo não sendo esta sua primeira língua. Eles queriam garantir que seus manuscritos fossem lidos e transmitidos para as gerações futuras. E não é que deu certo?

Hoje o novo testamento está publicado em mais de duas mil línguas e dialetos diferentes espalhados ao redor do mundo. Este é sem dúvida o livro mais divulgado em toda a história da humanidade. O novo testamento na verdade demorou um pouco para ser composto, algo acima de cinquenta anos até a sua finalização. E segundo a opinião de grande parte dos acadêmicos, da coleção que hoje nos chegou a carta inicial de Paulo aos Tessalonicenses teria sido o primeiro documento produzido e o evangelho de João teria sido o ultimo deles.

E o nome “Novo Testamento” de onde ele veio? A história vai nos dizer que tudo começou com Melito de Sardes que viveu no final do II século depois de Cristo. Melito preparou uma lista de livros sagrados das Escrituras e ao fazê-lo separou-os em dois grupos, os livros sagrados judaicos e os livros sagrados cristãos. Aos livros sagrados do judaísmo ele deu o nome de PALAIA DIATHEKE que significa antiga aliança. Aos livros sagrados cristão ele deu o nome de KAINÊ DIATHEKE que significa nova aliança. Encontramos também estes significados nos escritos de outro personagem, Irineu de Lyon. Autor da obra Adversus Haereses que foi um contemporâneo de Melito.

Por volta do IV e V século depois de Cristo o latim voltou a ser a língua oficial de todo Império Romano. Desta vez um outo autor chamado Jerônimo, fez a pedido do papa Damaso, uma nova tradução da Bíblia para o latim que foi intitulada de Vulgata Latina, traduzindo a palavra grega diatheke “aliança” substituindo por “testamentum”. Deste modo surgiram os títulos “Vetus Testamentum” ou “Antigo Testamento” para falar da antiga aliança e “Novum Testamentum” ou “Novo Testamento” para falar da nova aliança. Alguns acadêmicos argumentam se Jerônimo cometeu um erro. Porém, os estudos vão dizer que não necessariamente.

No tempo de Jerônimo a palavra testamentum, significava como também no português moderno, um testamento, ou seja, um documento que declara a vontade ultima de uma pessoa em relação de quem deveria herdar os seus bens após a sua morte. Os autores de fala grega de longa data chamavam este documento, estes testamentos de “diatheke” que poderia significar tanto aliança como testamento ou acordo, sendo assim as palavras são sinônimas. Daí a tradução de Jerônimo ficar “Novo Testamento”.
Agora, afinal o que é o Novo Testamento se não um documento oficial que revela a vontade de Jesus em relação aos seus filhos. Ele deseja que nós herdemos a vida eterna, e como brinde, ganhemos o direito de viver como príncipes no paraíso de Deus. É um testamento é uma aliança. E isto é maravilhoso? Não é mesmo?

Mas, precisamos lembrar, que esta expressão Novo Testamento, é apenas um título e o que importa é a mensagem que ela contém e a lembrança de que embora chamemos a primeira parte da Bíblia de Antigo testamento isto não significa que estejamos falando de uma parte ultrapassada e que não tem nada a ver com a doutrina cristã. É nas paginas da velha aliança que encontramos a base da nova aliança. A eterna aliança é inaugurada no ministério de Jesus, mas antecipada pelo Antigo Testamento.

Importa-nos, lembrar também, da seleção de livros que deveriam ou não compor o conjunto do novo testamento. Como é que chegaram a estes vinte e sete livros que temos hoje? Como é que foram escolhidos? Afinal de contas o cristianismo primitivo produziu muitos outros documentos inclusive uma boa quantidade de evangelhos. Mas porque apenas Mateus, Marcos, Lucas e João passaram a fazer parte do atual novo testamento? Esta é uma pergunta muito importante. Porque recentemente alguns autores tem colocado em dúvida a idoneidade das Escrituras, isto é, da lista oficial que compõe a Bíblia Sagrada, especialmente o Novo Testamento.

Alguns autores afirmam que foi Constantino e o concilio de Nicéia (ocorrido em 325 depois de Cristo) que definiram quais livros seriam ou não inseridos na Bíblia e que só aceitaram aqueles livros que não comprometiam a chamada ortodoxia da Igreja. Outros autores cristãos, por exemplo, haviam produzidos dezenas de evangelhos, mas apenas quatro foram liberados pela politica da Igreja para fazer parte do Canon sagrado. Noutras palavras, se isso for verdade o novo testamento não passa de uma manipulação politica engendrada pelo imperador juntamente com os líderes da Igreja. Isso é uma acusação muito séria, mas é uma acusação que simplesmente não procede.

Em primeiro lugar, Constantino tinha pouca ou nenhuma cultura teológica, logo ele mesmo não tinha nenhuma condição intelectual ou politica de oferecer uma direção relevante aos ditames do concilio. Prova disto é uma carta que ele mesmo enviou ao bisbo Ózio de Cordova relatando não entender nada sobre as questões cristológicas que estavam sendo discutidas naquele encontro. Além do mais, Constantino era simpatizante dos dois principais líderes gnósticos da ocasião, a saber, Ário e Eusébio de Nicomédia.

Os gnósticos eram um grupo que tinha interesse em acrescentar evangelhos estranhos ao Canon Sagrado da Bíblia Sagrada e eles tinham muito mais força politica que os demais. Logo se predominassem em Nicéia algo que fosse uma força politica, aí sim iriamos ter um Novo Testamento cheio de evangelhos gnósticos conforme eram os desejos dos teólogos de Alexandria, especialmente Ário. E tem outro detalhe a mais, o Concilio de Niceia, que como dissemos, aconteceu em 325 depois de Cristo, não tocou no assunto do Canon bíblico. Isso, aliás, nem fez parte da pauta para discussões.
Muito pelo contrário, os membros do concelho agiram como se o Canon já tivesse sido estabelecido anos antes. Tanto é que em 331 depois de cristo Constantino enviou uma carta para Eusébio de Cesareia encomendando a produção de cinquenta Bíblias. O texto dessa carta sobreviveu até aos dias de hoje e nada, absolutamente nada ali, indicam que livros deveriam ou não fazer parte do Canon Sagrado. O imperador queria apenas cópias da Bíblia e nada mais. Embora Atanásio tenha apresentado uma lista de vinte e sete livros em 267 depois de cristo, é fato conhecido que com apenas uma ou outra exceção a maior parte atual do novo testamento já era reconhecida, aceita e usada como autoridade por vários autores da Igreja bem antes do surgimento do concilio de Nicéia.

Em cerda de 180 antes de Cristo, Irineu de Lyon, fala de quatro evangelhos apenas e os compara aos quatro ventos do céu. E porque apenas quatro? Porque estes eram os únicos aceitos como legítimos. Além de Irineu, vários outros autores do II século, todos, portanto anteriores ao Concilio de Niceia, também aludiram ao Novo Testamento e aos textos evangélicos que hoje conhecemos. Entre estes autores temos Policarpo, Justino Martir, Pápias, Atenagoras e outros.

O teólogo anglicano John Borgam do século XVI chegou catalogar 86 mil citações do Novo Testamento em autores cristãos que viveram antes de Concílio de Niceia. É claro que tudo isso foi um processo. O Canon bíblico não caiu pronto do céu. Mas se não foi Constantino e Nicéia que definiram os livros do Novo testamento como foi que os primeiros cristãos decidiram que livros deveriam ou não fazer parte desta lista canônica.

Em primeiro lugar, é importante saber que a Igreja jamais decidiu ou escolheu livros, ela apenas reconheceu os inscritos por sua natureza de produção que já eram entendidos como inspirados desde o momento em que foram produzidos. Os sínodos e concílios posteriores da Igreja apenas ratificaram, isto é, confirmaram o reconhecimento dos primeiros cristãos. Até mesmo os gnósticos admitiam isso através do evangelho escrito por Valentino, um autor gnóstico do II século.

Mesmo antes disso Pedro já aceitava Paulo como autor inspirado. Paulo e João diziam ter recebido mensagens por revelação direta de Jesus cristo. Noutras palavras, os autores do Novo Testamento já pareciam reconhecer que estavam produzindo algo especial. O reconhecimento portanto que a Igreja fazia num inscrito inspirado era baseado em pelo menos três pilares ou critérios: a apostolicidade, a consistência e a universalidade. E o que significam estas três palavras?

A apostolicidade era o primeiro e principal critério para um livro fazer parte das escrituras cristãs, ou seja, ele deveria ter sido escrito por um apóstolo ou associado direto a um apóstolo de Jesus Cristo. Marcos por exemplo foi um associado do apóstolo Pedro. E Lucas do apóstolo Paulo. Contudo, se um livro foi escrito, mas de cem anos depois do tempo de Cristo, como parece ser o caso dos evangelhos apócrifos ele certamente não poderia pertencer a primeira relação ou geração daqueles que viram pessoalmente ao Senhor ressuscitado. Portanto não poderiam fazer parte do Canon e tinham a sua historicidade muito questionada.

A consistência se refere a harmonia doutrinaria que o texto deveria possuir com restante do Novo Testamento e também com o Antigo Testamento. Devido a uma aparente contradição entre Tiago e as Epístolas de Paulo, alguns demoraram aceitá-lo no Canon, mas hoje sabemos que tal contradição é apenas aparente.

 A universalidade trata-se de buscar o testemunho das igrejas primitivas, ou seja, saber se aquele texto circulou pelas igrejas cristãs como documento inspirado para edificação do grupo, do todo. A carta de Paulo aos tessalonicenses, por exemplo, não ficou apenas restritas, apenas aos cristãos da cidade de Tessalônica, pelo contrário, o seu original ou cópias dele certamente circulavam entre outras igrejas da Ásia Menor animando os irmãos na fé e explicando-lhes a doutrina de Jesus Cristo.

Agora ainda que não aceitássemos estes três critérios que mencionamos bastariam uma coisa para verificarmos que os textos apócrifos, especialmente os evangelhos apócrifos, não devem ser inseridos no Canon inspirado da Bíblia, sabe o que é? O seu conteúdo. Isso mesmo. Os evangelhos apócrifos são o maior argumento contra eles mesmos. Hoje existem várias traduções destes evangelhos gnósticos inclusive em língua portuguesa. O fragmento do evangelho de Tomé, por exemplo, datado do III século depois de Cristo. Neste evangelho conta-se que o menino Jesus construiu pequenas represas e fez pardais de barro para brincar com eles. Seu pai José acabou brigando com ele porque estava fazendo aquilo no dia de sábado. Então Jesus ficou irado, bateu palmas e os pardais foram embora. Os pardais de barro levantaram voo e foram cantando.

Noutra parte do mesmo evangelho, um menino qualquer passou correndo e esbarrou no ombro de Jesus. Este então ficou novamente irado, amaldiçoou o menino que morreu na mesma hora. Os pais do menino morto foram reclamar com José, o pai adotivo de Jesus, e por causa disto, ambos ficaram cegos. Histórias ridículas como estas relatadas acima povoam os textos apócrifos, não só dos evangelhos, mas também de outros tratados como os atos de João, os atos de Pedro, o apocalipse de Maria e outros textos mais. Não precisamos ir tão longe, para percebermos, que não se tratam jamais de histórias inspiradas por Deus.

Mas existem muitos que ainda podem dizer que os evangelhos canônicos, que estão em nossa Bíblia, também relatam histórias fora do comum, como por exemplo: Jesus andando sobre as aguas. Jesus subindo ao céu em carne e osso. Jesus alimentando milhares de pessoas com cinco pães e dois peixes. Mas o que questionamos nos apócrifos não são descrições de milagres, pois milagres podem de fato ocorrer. O que questionamos é a natureza imoral daqueles eventos. Multiplicar pães para saciar a fome é diferente de amaldiçoar um menino que acidentalmente esbarrou em seu ombro.

E se ainda existir alguém insatisfeito com os argumentos apresentados, vamos aqui, apresentar algo a mais, para desmentir que o cânon nasceu em Nicéia por influência de Constantino. Vamos, por um instante, supor que esta afirmação estivesse correta, ou seja, que o Novo Testamento seria mesmo fruto de uma trama politica envolvendo o Imperador de Roma e os líderes da igreja cristã daquele tempo. Vamos ainda supor que todos os inscritos que conspirassem contra a igreja fossem retirados arbitrariamente por feririam os pressupostos teológicos do Cristianismo.

Agora vamos raciocinar. E se foi realmente isso que aconteceu. Então temos um problema. É que por alguma razão, textos que deveriam ser excluídos acabaram ficando no cânon. E porque dizemos isso? Simplesmente porque o Novo Testamento contradiz varias praticas da igreja do IV século. Por exemplo: embora alguns cristãos preferissem ser batizados depois de adultos ou perto da hora da morte, a igreja nesta época já dava grande ênfase ao batismo infantil idealmente realizado nas primeiras semanas de vida do bebê.

Mas nada, nada no Novo Testamento endossa essa pratica, pelo contrário, as passagens neotestamentárias parecem coadunar mais com uma cerimônia batismal feita num etapa da vida em que a pessoa podia conscientemente  dizer se crê em Cristo e desta forma estar pronto para ser batizada. Noutras palavras, a ideia batismal do novo testamento conspirava contra a prática da Igreja do IV século.

Em 370 inicia-se uso de velas sobre o altar. Pelo fim do IV século Basílio de Cesaréia e Gregório Nazianzeno, inauguram o culto aos santos como intercessores diante de Deus. Também na mesma época, São Paulino de Nola, introduz o uso de crucifixo como amuletos e ensinam os cristãos a orarem pelos seus mortos. Novamente, nada disso tem confirmação no Novo Testamento, logo, se a preocupação da Igreja era criar artificialmente o cânon de livros que sustentassem os seus ensinos e seus dogmas, porque então forjou livros que legitimam estas praticas?

Agora, este ultimo exemplo, é ainda mais forte! Em 377 depois de Cristo, como podemos ver, sempre em torno do final do IV século, Santo Epífanio de Salames, inaugurou o que seria no futuro conhecido como o dogma do sono ou da morte da Maria. Seguido pelo milagre de sua assunção corpórea ao céu. Este dogma ensinava que Maria foi recebida nas alturas pelo próprio filho de Deus. Ora, esse importante ensinamento da igreja latina e também da igreja ortodoxa oriental, não se encontra em parte nenhuma dos textos canônicos nem no livro de Atos dos Apóstolos. Seu mais antigo relato estaria num evangelho apócrifo chamado “Liber Requiem Mariae” ou Livro do Repouso de Maria. Produzido igualmente no IV século depois de Cristo. Deste livro restou apenas uma cópia escrita em Ciríaco.

Novamente, por que o concilio de Niceia não incluiu esse importante documento no cânon? Por que deixou de fora um texto tão importante que validaria doutrinariamente o tema da assunção de Maria ao Céu? Vamos ainda mais longe. Por que o concilio de Niceia não forjou textos com supostos dizeres de Cristo profetizando a conversão de Constantino ou textos estabelecendo o bispo de Roma como líder inquestionável de toda cristandade? A resposta é obvia, simplesmente porque o concilio de Niceia, ainda que tivesse algo de politico, não se prestou a esse papel. E os que fazem tal afirmação, distorcem a história para criar dúvidas acerca da idoneidade da Palavra de Deus.


Bibliografia
- Bíblia Apologética com Apócrifos – Instituto Cristão de Pesquisas – Revisão 1997.
- https://pt.wikipedia.org 

- A história Ilustrada do Cristianismo: a era dos mártires até a era dos sonhos frustrados – Editora Vida Nova – Edição 2011.